
O estado do Pará, “rio-mar” em tupi-guarani, recebeu esse nome por causa de seus rios que parecem oceanos. Pa’rá traduz a força das águas que sustentam a vida amazônica. Mas o Estado parece ter esquecido o que o próprio nome carrega. Desde os anos 70 com a construção da hidrelétrica de Tucuruí para atender mineradoras, a história se repete com novos nomes e velhos interesses. Vieram barragens, usinas, mineração.


Enquanto isso, o mundo avança no reconhecimento dos direitos da natureza: rios, florestas e oceanos são entendidos como sujeitos de direito, e não como recursos a serem explorados. O Brasil, porém, segue na contramão. Em vez de proteger a Amazônia e seus cursos d’água livres, o país abre caminho para a privatização dos rios. Sem qualquer futuro, insiste em transformar os rios em estradas industriais, a serviço de multinacionais da soja, da mineração e da madeira.


Essa contradição se evidencia em decisões recentes. Às vésperas da COP30, o governo Lula publicou decreto que abre caminho para a concessão dos rios brasileiros (https://abre.ai/privatizarrios). No Pará, o governo Helder acelera um pacote de hidrovias e portos que espreme o estado entre seus dois grandes rios, a leste e a oeste.



Nos leitos e margens dos rios Tapajós e Tocantins-Araguaia vivem incontáveis seres: aves, peixes, quelônios e outros répteis, muiraquitãs e outros anfíbios, árvores antigas e palmeiras, lianas e cipós, fungos, insetos, microrganismos e comunidades humanas. Povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos seguem no ritmo do território ancestral. Agora querem transformar essa paisagem de abundância em rota de exportação. Mas não há lucro de multinacional que substitua a função planetária da Amazônia em pé.


No Araguaia, o plano prevê explodir o Pedral do Lourenção, berçário de peixes e lugar sagrado na cosmologia ribeirinha (abre.ai/pedraldolourencao ). No Tapajós, estão previstos 41 portos (abre.ai/dragagemtapajos ), somando-se à poluição por sedimentos e mercúrio.


O estado parece trocar milhões de vidas pelo lucro de corporações transnacionais. É o que pesquisadores chamam de neocolonialismo logístico: o território vira passagem; a riqueza passa, a pobreza e a contaminação ficam.
