Reflorestar é honrar ciclos

Reflorestar não é só plantar árvores, é reconstruir e respeitar relações. É entender que as espécies se sucedem no tempo e no espaço. Umas gostam de sol, as heliófitas. Outras de sombra, as umbrófitas. Então primeiro vemos a natureza surgir com as espécies que necessitam de intensidade luminosa. E assim, com o tempo, surgem as que precisam de um lugar sombreado para crescer. Assim, honrando ciclos, a transpiração resultante da  fotossíntese resfria o ambiente: conseguimos atingir a estabilidade térmica e hídrica do sistema. As espécies ocupam diferentes alturas no espaço (estratos) para se expressar com todo seu potencial. Pouco a pouco, cada folha que é um painel solar, sobrepostos uns sobre os outros, atingem o aumento da capacidade total do ecossistema de fazer fotossíntese e produzir biomassa. 

Ernst Götsch costuma citar que plantas iniciais, médias e tardias, como ervas, arbustos e pioneiras seguem a lógica generativa e cada uma tem uma função na cobertura do solo, funcionando como placenta que guardam a floresta em regeneração. Já as plantas secundárias e climáxicas seguem a lógica regenerativa dos organismos.

É no coletivo que atingimos complexidade.Dessa forma, na regeneração de ecossistemas, temos uma distribuição de densidade com muitas plantas de baixo estrato e algumas que despontam, com o tempo, com altura suficiente para segurar o céu. Essas espécies emergentes ocupam entre 15 a 20% da cobertura do sistema, enquanto as de altura baixa são 80%. Ao observar a floresta ao longo do tempo, vamos ver ela se refazendo infinitas vezes sob o dossel das copas das árvores. 

Povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e agricultores familiares, em diferentes biomas, há muito reconhecem que a abundância não vem do acúmulo, mas da convivência entre os ciclos. Suas roças, quintais e sistemas de manejo expressam uma lógica de regeneração que respeita o tempo da terra e escuta o chamado da floresta.

É preciso respeitar a floresta como a floresta quer ser. Com ritmos, funções e interdependência. Reflorestar, nesse sentido, é respeitar que a rede de recursos é para todos na comunidade de seres vivos que interagem com o ecossistema, ampliando a quantidade e qualidade de vida existente em cada lugar. É lembrar que não se regenera o mundo com pressa, mas com presença. Que a vida só prospera quando respeitamos sua sucessão.

Cada ciclo tem seu papel. Cada espécie, sua missão. Cada tempo, sua potência. E, como nos lembra Ernst Götsch, “a sucessão natural é o meio pelo qual a vida atravessa o espaço e o tempo”. 

Saiba mais:

Vida em sintropia: agricultura sintrópica de Ernst Götsch explicada. Por Dayana Andrade e Felipe Pasini.1. ed. Labrador, 2022 e ed. Bambual, 2023: https://abre.ai/vidaemsintropia

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