
Recife submersa? O mar não chega de assalto: infiltra-se aos poucos, até que ruas virem canais e prédios se tornem carcaças para mergulhos de naufrágio. E assim, num futuro não muito distante, esse risco é real. Recife é hoje a 16ª cidade mais vulnerável do mundo à mudança do clima, segundo o IPCC. O mar sobe em média 0,54 cm ao ano desde 1940. Até 2100, áreas inundadas podem chegar a 33,7 km² da cidade. Hoje, 44% do território já tem risco alto de alagamento (https://abre.ai/nexo-recife).

A capital pernambucana é a mais baixa do Brasil, erguida sobre uma planície fluviomarinha de rios, ilhas e manguezais. É tanta água que os recifenses dizem que “o Rio Capibaribe se encontra com o Rio Beberibe para formar o Oceano Atlântico”. Mas a beleza da “Cidade das Águas” esconde a urgência de adaptação. Como lembra Marcus Silva, professor da UFPE: “Teremos problemas de transporte, esgotamento sanitário, tem tudo isso junto. Precisamos pensar nesse convívio compartilhado com a água” (https://abre.ai/g1-mar-vai-engolir-recife).

Em 2022, as chuvas mais fortes em 42 anos deixaram 133 mortos no Grande Recife. Os riscos se acumulam: enchentes, deslizamentos, ondas de calor, secas, doenças e o avanço do mar.
Mas a ganância do mercado é cega e a especulação imobiliária, imoral. O exemplo mais emblemático é o Projeto Novo Recife, no Cais José Estelita: 10 hectares com 13 torres de até 40 andares, símbolo do avanço do capital sobre o estuário. Foi contra ele que surgiu o movimento Ocupe Estelita, em defesa da memória do Pátio das Cinco Pontas e do conjunto histórico dos bairros de Santo Antônio e São José.

Enquanto isso, comunidades vizinhas como Bode, Ilha de Deus e Brasília Teimosa resistem em palafitas sobre o mangue. Pescadores e marisqueiras que dependem do estuário enfrentam tanto a pressão da especulação quanto os impactos do clima: enchentes, mar avançando e perda da qualidade da água.
Adaptar não é apenas conter as águas, mas proteger manguezais, criar infraestrutura para conviver com a água e preparar saídas seguras e dignas para famílias que terão de deixar áreas de risco. Sem isso, Recife pode se tornar não só a “Veneza Brasileira”, mas uma Atlântida tropical submersa.
