Muito sol e o vapor de água liberado pela transpiração das plantas, junto com a evaporação das águas, sempre marcaram a atmosfera sobre a Amazônia. A parte mais alta da floresta, com o entrelaçamento de todas as copas, é chamada de dossel. As nuvens formadas acima desse tapete verde são do tipo cumulus, cheias de gotículas de água, baixas, brancas e espessas. Carregadas de pequenas gotas, essas nuvens ajudam a refletir a radiação solar, pois as gotículas funcionam como pequenas superfícies espelhadas. Além disso, elas dispersam a radiação, desviando a luz em várias direções dentro da própria nuvem.
O climatologista Antonio Donato Nobre relata em seu site de reflexões Pensando a Vida na Terra uma epifania que teve durante um sobrevoo sobre a Amazônia. Ele cruzava nuvens carregadas de umidade e observava prismas formados pela luz.
“Com o formato de algodão doce, resplandeciam estas nuvens de um branco puro, todo o quadro emoldurado por uma variedade de outras nebulosidades de água em suspensão, cujas matizes variavam do branco ao cinza chumbo. Acima deste grande teatro tridimensional, disputando espaço na abóbada celeste onde deslizava sereno nosso avião, delgadas formações translúcidas flutuavam no invertido oceano azul-oxigênio do infinito. Como se toda esta visão de beleza não fosse suficiente, as variadas nuvens de baixa altitude estavam quase todas descarregando seu precioso líquido sobre a floresta, como regadores no jardim do Éden. Neste momento veio o golpe de misericórdia, que fez imaginar-me transitando num outro mundo etéreo: a iluminação solar rasante a projetar-se sobre estas nuvens, meu ângulo privilegiado de visão e os cristais no líquido em precipitação entraram em sinergia num efeito extraordinário de refração da luz branca, produzindo milhares de micro arco-íris, creio um para cada gota, colorindo a chuva em toda sua altura, da fonte na nuvem, cujo branco não se contaminava com as cores, até o sombreado tapete verde na floresta.”
Essa descrição científica e poética-filosófica do fenômeno causado pela refração, dispersão e reflexão interna da luz ao passar por gotas de água é arrebatadora. Mais avassalador ainda é perceber a grandiosidade da floresta viva em pé, com milhões de árvores transpirando, carregando o céu de umidade e criando um clima ameno. A força da Amazônia está em sua capacidade de atuar no ciclo hidrológico de todo o continente e equilibrar o balanço energético da Terra, refletindo a radiação solar com suas nuvens gentis. Em conversa conosco, Nobre explicou que, em uma atmosfera limpa sobre a floresta, o “oceano verde”, formam-se nuvens do tipo cumulus, que produzem chuvas abundantes. Os ventos associados à precipitação dessas nuvens são moderados.
Quando a floresta é tomada pelo fogo, desmatada ou explorada sem limites, não perdemos apenas árvores e biodiversidade. Perdemos a capacidade de gerar chuvas de arco-íris, de enviar rios voadores pelo continente e de manter o delicado equilíbrio do clima. Perdemos a alma viva que sustenta o ciclo da água e a harmonia energética da Terra.
Saiba mais:
Chuvas de Arco-Íris: https://tinyurl.com/4v4s7z8u
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Química atmosférica na Amazônia: a floresta e as emissões de queimadas controlando a composição da atmosfera amazônica – Acta Amaz. https://doi.org/10.1590/S0044-59672005000200008