Lei das Águas e os retrocessos do Marco do Saneamento e Marco Hídrico

Em julho de 2020, com o país prestes a superar 100 mil mortes por Covid-19 e dificultando ampla discussão, o Congresso alterou o marco do saneamento básico (Lei 14026/20), abrindo as porteiras para a privatização da água. Primeira baldada na cabeça de todos os brasileiros. Passado um ano e meio, preparam o segundo golpe. Em dezembro do ano passado, quando o Brasil já acumulava mais de 610 mil mortes por Covid-19, o governo chegou com o Projeto de Lei (PL) no 4.546/2021 para instituir o marco da infraestrutura hídrica , sem qualquer consulta ou transparência. 

“Não é razoável propor uma alteração em uma das leis mais importantes do país, a Lei das Águas, que impacta a vida das pessoas, o meio ambiente, a economia e a própria gestão dos recursos hídricos, sem um mínimo de consulta estruturada e transparente para tratar de um tema estratégico para o país.”

Samuel Barrêto, gerente nacional de Água da The Nature Conservancy Brasil (TNC-Brasil)

A indústria, o lobby político, a corrupção. Os congressistas viraram as costas para metade do país que continua sem coleta e tratamento de esgoto e aceleraram mudanças em artigos fundamentais. Aprovaram as alterações sem ouvir comitês de bacias (unidades de planejamento dos recursos hídricos). Definiram o rumo do mais importante bem comum de todos, vital bem público, de interesse público, aquele que é direito indispensável à vida e à saúde humana: a água.

Sem dúvida, o setor é fonte de negócios muito lucrativos nas cidades mais ricas, onde grandes companhias públicas já dispõem de rede instalada em operação nos principais bairros, entregando além da infraestrutura, os usuários de bandeja. A cereja do saneamento fez os olhos dos investidores brilharem, mas e a parte deficitária da população ainda sem rede que precisa de investimento pesado para avançar? E os 100 milhões de brasileiros que não têm acesso a sistemas de esgotamento sanitário nas periferias e em milhares de municípios pobres do país? Como o governo vai atingir a meta da universalização do saneamento básico se metade da população não entrou na equação?

TARIFA SOCIAL PARA VIABILIZAR ÁGUA POTÁVEL PARA O USO DIÁRIO DE TODAS AS PESSOAS

Na lei de 2007, estabeleceu-se que os sistemas tarifários das companhias de saneamento deveriam ser inclusivos, garantindo o acesso de todos aos serviços e promovendo a equidade. Famílias na linha de extrema pobreza e pobreza que não conseguem arcar pelo serviço não podem ficar sem água. Um parâmetro para ter acesso à Tarifa Social seria beneficiar os integrantes do CadÚnico. Mas a mudança feita em 2020, condiciona o saneamento básico à viabilidade econômico-financeira da prestação dos serviços.

No relatório “Água como Direito, Tarifa Social como Estratégia”, os autores questionam “como será o futuro das Tarifas Sociais com a maciça privatização dos serviços, promovida pela Lei nº 14.026/2020, em que a voracidade das empresas privadas pelo lucro procurará remover qualquer potencial perda de arrecadação? Qual será o nível de independência dos reguladores para controlar essa voracidade?”

Saiba mais:

PDF Água como Direito, Tarifa Social como Estratégia – ONDAS, 2021: https://bit.ly/3I1CpsJ

25 anos da Lei das Águas no Brasil: conquistas, desafios e ameaças com o PL do Novo Marco Hídrico – Água TNC-Brasil/Um Só Planeta: https://bit.ly/3LIwIls

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